The Court - Honoré Daumier.
Por Danilo José Viana da Silva
Uma das questões que acho mais admiráveis e das quais é possível se
fazer uma leitura sociológica corresponde as caricaturas dos “funcionários da
justiça” de Honoré Daumier: a forma como ele consegue figurar o fato de o
capital jurídico não existir apenas mediante as categorias de pensamento e de
construção cognitiva do mundo, mas também por meio de uma hexis corporal específica
(tal como podemos encontrar na sociologia do campo jurídico desenvolvida por
Pierre Bourdieu). Nesse sentido, o capital jurídico (espécie de capital simbólico
e cultural) pode existir de três formas: na forma incorporada, no interior dos
agentes mediante um habitus, ou seja,
por meio de determinados esquemas de pensamento (somando-se a isso o uso de uma
linguagem protocolar) e de práticas; o
fato desse capital existir também no estado objetivado nas instituições específicas
do campo jurídico, quer dizer, nos livros doutrinários, nas vestimentas, nas arquiteturas
dos tribunais (nas togas, perucas, etc); e no estado institucionalizado sob
forma de capital cultural certificado e garantido pelo diploma, “essa certidão
de competência cultural”(BOURDIEU, Pierre. Os três estados do capital cultural.
In.: Escritos de educação. Editora: Vozes, 14 ed. p. 86) exigida para o
ingresso nas lutas que se desenrolam no interior do campo jurídico e que
contribui para a constituição do corpo de juristas como, diria Weber, “um grupo
de status” que se caracteriza como um
corpo, semelhantemente ao grupo de sacerdotes, “societalizado por meio de seu
estilo de vida específico, suas noções de honra convencionais e as ocasiões econômicas
que legalmente monopoliza. Um grupo de status
sempre está societizado de uma ou outra forma, ainda que nem sempre esteja
organizado em uma associação (WEBER, Max. Sociologia das religiões. 1.ed.
Editora: Ícone, 2010. P. 46) . E é justamente esse conjunto de propriedades
específicas que constitui o capital jurídico enquanto um elemento que contribui
para a reprodução da distinção entre os profissionais do trabalho jurídico e os
profanos (equivalente estrutural da distinção entre os sacerdotes e os leigos
na sociologia da religião de Weber).