Por Danilo José Viana da Silva
Muito interessante, debate louvável. Porém, gostaria apenas de fazer
alguns questionamentos que as vezes, por conta do conforto escolástico que a
vida acadêmica pode nos propiciar, são ignorados ou esquecidos: Quais
são as condições sociais de produção dessa potência afirmativa da imaginação?
Em outras palavras, será que essa potência é pensada de forma equivalente ao
bom senso que, segundo Descartes, “é a coisa mais bem distribuída do mundo”?
Quando se pergunta sobre as condições sociais de produção da imaginação, da resistência
política e da tomada de consciência, o que acaba entrando em jogo é justamente
a questão referente a quais probabilidades de as pessoas que vivem em um
contexto de miséria e pobreza extremas (tal como aquelas retratadas no documentário
“Garapa” https://www.youtube.com/watch?v=Cz76iw4r2_I
) chegarem ao nível de uma imaginação polítcia que pressupõe uma certa
inclinação e cultura políticas para a resistência em contraposição a resignação.
Em outras palavras, como ficaria o caso daqueles e daquelas que, historicamente
retratados em diversas obras literárias e artísticas, tais como “Vidas Secas”
de Graciliano Ramos e nas obras de Portinari, derrotados pelo sol escaldante e
moralmente humilhados em uma situação de aguda desigualdade econômica e social,
e que, sem expectativas nem sobre o presente ou sobre o futuro, foram desapossados
das oportunidades de fazer parte da própria atuação efetiva na política? Como
ficaria a condição dos mutilados socialmente e simbolicamente, daquelas pessoas
submetidas, pela situação degradante em que vivem, a um estado de invisibilidade
cívica”?
Esse problema nos leva também a perguntar o seguinte: para quem esse
discurso é realizado? Para aqueles e aquelas que, pelo fato de terem um acesso considerável
a uma educação e a um capital cultural e social para a luta política, em
contraposição a resignação, podem efetivar essa resistência? Quais as condições
sociais da “experiência da intervenção política” e da “indignação política”?
Como
explicar a situação de todos e todas que, por não poderem perder uma “crença”
que nunca tiveram, justamente pelo fato de estarem desapossadas das condições
de acesso a cultura política necessária para se acreditar na política, estão
relegadas a uma vida mutilada e que sofrem os efeitos do que o próprio Safatle
chega a chamar, no debate, de “princípio de exclusão brutal”? Se pensarmos de
acordo com a relação gangorra entre os conceitos de ‘Saída’ e ‘Voz’ desenvolvidos
por Hirschman, como explicar a falta de opções de ‘Saída’ para todos aqueles e
aquelas que dependem dos serviços públicos de saúde e educação, e como explicar
que, mesmo diante da eminente aprovação da PEC 241, as camadas mais pobres e estigmatizadas
ainda não exerceram com vigor, diante do perigo eminente, a ‘Voz’, a
resistência e exigência de melhores serviços públicos? Quais as condições
sociais de produção da ‘Voz’, da resistência política?
Para aqueles e aquelas
que, por viverem em situações degradantes, dependem de uma prestação maior e
mais eficiente dos serviços públicos de
saúde, educação e assistência, a opção
pela ‘Saída’, ou seja, a opção por não utilizar mais esses serviços tendo em
vista a sua prestação degradante, pode ter como efeitos a desnutrição, a fome e
a morte.