segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Sobre a vulgata planetária do governo anti-pobre





Por Danilo José Viana da Silva




Um dos termos mais característicos da vulgata global neoliberal de desmonte dos programas sociais é “Flexibilização”. Ele corresponde a um indicador das tomadas de posição no campo político dos mais variados governos que adotam, com a ajuda de toda uma rede interligada de agentes que se apresentam com a bandeira da “novidade”, um projeto de precarização do trabalho. Através da considerável flacidez desses termos, os projetos mais nefastos para toda a classe de trabalhadores assalariados podem ser eufemizados e adocicados de acordo com uma vulgada global. 

São  “termos isolados e aparentemente técnicos como ‘flexibilité’ [flexibilização] (...) que, por encapsularem e silenciosamente comunicarem toda uma filosofia de organização individual e social, adaptam-se bem a funcionar como verdadeiras senhas e lemas políticos (nesse caso, a necessidade de redução e difamação do Estado, a redução da proteção social e a aceitação da difusão do trabalho assalariado precário como um destino, ou melhor, uma benção).” (BOURDIEU, Pierre e WACQUANT, Loïc. A astúcia da razão imperialista. In.: O mistério do ministério. Ed. Revan. P. 211-212) 

Eles funcionam como parte da Meca simbólica a partir da qual o projeto de imposição do trabalho precário pode ser implementado docemente; eles correspondem, assim como os termos “simplificação do direito do trabalho”, a verdadeiros chavões que dissimulam, ainda que mal, todo esse projeto de política cuja remodelação do Estado está baseada em uma política de endurecimento da legislação penal e policial (juntamente com as investidas bélicas do atual Ministro da Justiça que já sinalizou a necessidade de se investir menos em “pesquisa e mais em armas”), com a precarização do trabalho, com a redução dos investimentos em educação (com sinalização do atual Ministério da Educação de cortes de cerca de 45% dos investimentos direcionados as Universidades Federais e com a suspensão de várias bolsas de estudo tanto do PIBIC quanto de Mestrado e Doutorado, juntamente com a mais recente sinalização do atual governo no sentido de suspender  políticas que visavam reduzir os índices de analfabetismo).

 Tudo isso muito bem recheado com os mais diversos escândalos que,  decorrentes dos mais diversos vazamentos que frequentemente pipocam nas mídias virtuais e televisivas onde conversas entre um senador e ex-ministro com o ex-presidente da Transpetro,  apontam claramente que esse acordo travestido de Impeachment entre os mais diversos regentes dos mundos econômico, midiático, jurídico e político visa  ( além da realização dos seus próprios interesses custe o que custar)  o “estancamento da Sangria”, como fala um dos interlocutores, representada pelas investigações e divulgações dos esquemas de corrupção dos personagens do Congresso Nacional. Essa reconfiguração do campo do poder nada tem a opor a um verdadeiro projeto que tende a contribuir para a intensificação da insegurança objetiva e subjetiva das camadas mais pobres. 

Com a imposição de uma imagem do assalariado como um empresário dinâmico de suas próprias conquistas, verdadeira versão self made man à brasileira. Trata-se de um projeto que ataca amplamente os setores, ainda que fragilizados, das políticas de proteção social. São tempos nada engraçados. De fato, “não há motivos para rir”, como diz Bourdieu a Günter Grass em um debate sobre “a invasão conservadora.”